SERVIÇAL POR NATUREZA

SERVIÇAL POR NATUREZA

Passaram-se muitos anos para que eu pudesse realmente perceber-me como cidadão. Olhar o entorno não é falta de foco, mas não fazê-lo é boa dose de desprezo e desidentificação perversa, fruto dos resquícios escravagistas carregados por cada um de nós. Nessa semana tive, por coincidência do destino, que escutar num mesmo dia, de pessoas distintas e em ocasiões diferentes, o exemplo ao qual eles denominam como efeito “garçom de festa”. Trata-se da exemplificação de alguém vendendo privilégios de serventia em ocasião festiva, ou seja, o descarado fato de que desnecessariamente existem corruptos e corruptores atuando a todo momento. Isso parece ser o atestado de que o capital tudo pode aqui na terra das bananas, ou das cascas delas, que serão a única parte restante destinada aos moradores desta republiqueta. Não pisar e escorregar em uma delas é questão de tempo, mas os ricos estão comprando a própria sorte sem mentalizar que a dualidade universal de tudo nos faz experimentar antônimos de vida. Como se diz no ditado, um dia a casa cai, e talvez aí, na minha singela interpretação, ratos e baratas estejam mais aptos a sobrevivência que os próprios mandatários do que outrora fora um belo lar.
Outro péssimo exemplo que já escutei por diversas vezes foi a confissão de certas pessoas de que, por ao menos uma vez na vida, teriam se dado a “oportunidade” de comprar um guarda de trânsito. É muito triste escutar uma coisa dessas. Por isso existem ditados como ” a ocasião faz o ladrão”. Se alguém tenta explicar isso a um sueco com certeza o mesmo terá dificuldades de entendimento.
No andar de baixo da sociedade escravos pós modernos vendem seu desqualificado trabalho a preços vis. Desconectados das causas que levam a sua marginalização tocam uma vida acrítica, sem percepções outras que não sejam a sobrevivência numa selva onde o desemprego e a fome batem na porta do vizinho. No andar de cima, meia dúzia de pessoas detém o aporte financeiro correspondente a mais da metade da população. Despreocupados com a sociedade, desacoplados da nação, bancam bancadas de políticos e compram o judiciário vendido, cooptado e politizado, enterrando as leis no mais profundo abismo, para onde serviçais brasileiros são diuturnamente empurrados na tragédia comandada por canetas de ouro com tinta estrangeira.