SUSTENTABILIDADE

SUSTENTABILIDADE

Para traçar uma reta e seguir uma meta são necessários dois pontos, pois uma chegada está atrelada a uma saída. Para fazer um plano, é preciso de um terceiro ponto. A física explica o que as mentes precisam de mais tempo para entender, mas já me prendo aqui a conceitos de equilíbrio e pilares. Não existe plano sem meta, nem se sustenta nada sem pilares bem construídos. A equação da vida é tão simples quanto a complexidade das dosagens de sol e chuva ao longo das estações, fechando um ciclo anual onde qualquer desbalanço muito grande leva a secas ou inundações. Para os seres, digo que a paixão levanta e o amor sustenta. Na vida, há de se projetar e construir, pois construção sem projeto costuma dar problema, e projeto sem construção é perda de tempo. Nascemos com uma energia que precisa se dissipar enquanto o corpo se prepara para equilibrar-se. Crianças têm o costume de jogar para fora excessos desbalanceados de gasto energético. Adolescentes iniciam o aprendizado de onde gastar calorias e, por vezes, se perdem entre preguiças e epifanias. Adultos saudáveis exercem a sustentabilidade corporal acoplando sono ao cansaço, descanso ao trabalho, alimentação ao exercício. Idosos padecem do corpo enquanto sua energia vital diminui a ponto de não conseguirem força suficiente para fazer tudo sozinhos. Poucos anos atrás, vi meu avô dizer que gostaria de manter a mente boa em detrimento ao físico. Naquela época pré-pandêmica, ele praticava uns três esportes, e seus músculos ainda correspondiam às suas expectativas. Atualmente, ao andar, passos curtos e lentificados tornaram sua locomoção muito difícil. Seus hálux (dedões dos pés) fletiram para adaptar um equilíbrio cada vez mais dificultoso. A audição o deixa isolado em pensamentos pela recusa em usar aparelhos auditivos. O sorriso marcante deu lugar apenas a uma fisionomia sem muitas rugas pela falta de expressão. Sua admirável força de vontade combina com a marca do chinelo de couro, “pegada”; portanto, segue subindo escadas, se apoiando em objetos, negando ajuda, preso em pensamentos determinados de que está se adaptando aos 94 anos. Isso me frustra, me entristece, mas também inspira e mostra que a vida é agora e que o futuro costuma cair em meio ao vão. E que realmente algo nos espera, até mesmo as coisas que desejamos, mas pode ser que não sejam bem como pensamos que seriam. Passada a pesada sustentabilidade corporal, certas coisas também costumam aumentar de peso. Será que é sustentável uma mente não alimentada? A plasticidade neuronal abre caminhos para se pensar que a neuromodulação define a forma de encarar o mundo. A sociedade dos desejos não ensina a criar padrões sustentáveis de expectativas com frustrações transformadoras. A falta de aprofundamento cerebral não costuma trazer conexões profundas do eu que possam se reverter em alteridade, integridade e sociedade. Estudos mostram que as fases do sono precisam ser dormidas em conjunto, pois não se aprofunda o superficial, nem o contrário acontece. Dormir mal se traduz em falta de sonhos e cansaço. O excesso de ansiolíticos já parece apontar para a predisposição a doenças degenerativas. Neurocientistas falam em sistema glinfático como responsável pela limpeza cerebral que um bom descanso noturno nos traz. Não é sustentável a inércia para quem almeja mudanças. Não se sustenta o medo para os que paqueram a alegria. Não se sustenta a culpa quando uma raiva provocada não é sublimada numa ressignificação de respeitosa desculpa com o vitimizado. Algumas tribos indígenas, julgadas pela crueldade em enterrar bebês “defeituosos”, entendiam da fragilidade de suas necessidades laborais acopladas ao extrativismo consciente, onde a falta de excessos rendia trabalho a cada integrante da tribo, não havendo espaço para expectativas de cuidados infrutíferas. Mudadas algumas crenças ao longo dos anos, é impressionante a adaptabilidade atrelada ao entendimento da mudança de conjuntura, pois algumas tribos reconhecem qual o tipo de doença seus enfermos carregam. Problemas “de índio” são tratados na tribo, mas enfermidades “de brancos” os levam a hospitais. Problemas trazem insustentabilidade quando há ausência de soluções. Um psiquiatra cansou de seus doentes ao perceber que as pessoas não resolvem seus males pela falta de capacidade em saber viver. Tornam-se solicitadores de psicotrópicos, mas não dormem bem, comem mal, gastam suas energias com a objetação de suas relações e se recusam a saídas que não sejam fáceis, mas resolutas. A conta não fecha, e correr atrás do rabo virou o ciclo da moda. Negócios sucumbem porque parasitismos sem relação de ganha-ganha trazem falência e precarização. Crimes não deveriam compensar. Sustentabilidade tem a ver com durabilidade, pois o tempo corrói fragilidades. Vide alguns carros japoneses famosos por suas baixas manutenções atreladas à fidelização de seus clientes. No entanto, como a propaganda do refrigerante Sprite dizia antigamente — “sede é tudo” —, dando alma ao marketing de coisas caras e ordinárias que inexplicavelmente vendem aos fiéis da aparência do status social. São os famosos “bonitinhos e ordinários” carros de “um dono só”. Ecologia tem tudo a ver com essa sustentação do mundo. Só aqui permaneceremos se conseguirmos o desafio de mudar o rumo de perecimento do planeta Terra. É insustentável a relação dos humanos com os seres vivos, incluindo os da sua espécie. Racismos, sexismos, xenofobias, fundamentalismos… destroem razões para viver. Devastação está associada à falta de empatia. Como dizia Gonzaguinha: “chega de tentar dissimular e disfarçar e esconder o que não dá mais pra ocultar e eu não quero mais calar … explode coração”. SustentAção para evitar essa explosão do mal.

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